Numa simplicidade particular o Amor ensina a arte do Universalizar

Por Pe. Éder Carvalho Assunção – Missionário da Prelazia de Lábrea no Corno da África [email protected]

A humanidade traz em si uma força salutar, capaz de revolucionar, capaz de socializar os meios pra uma felicidade universal. Ela caminha com ânsia de verdade, ela se extasia diante da pluralidade, ela se alegra com a beleza da novidade.

Que bom seria, se assim permanecesse, porém, o poder e a “síndrome da superioridade” também entram nesta história e realizam uma grande escravatura. Esta amarra a bondade, sufoca a beleza e enterra a verdade. Entretanto, em meio à aridez existe a esperança de alguns que não desistem. Quando amarrados eles se soltam na flexibilidade, quando sufocados eles buscam ar no mais profundo interior, quando enterrados eles utilizam as garras da resistência para novamente verem o Sol que não se apaga.

Assim é a Epifania do Senhor, um fenômeno que vai além da radicalização da uniformidade cultural-econômica-religiosa; que geram os terríveis conflitos que perpassam a história da humanidade; ela se debruça na universalização dos valores e das virtudes.

Nesta perspectiva surge a vocação de Abraão (cf.Gn12). Vocação “esta” presente em cada pessoa humana, que independente de sua história cultural-econômica-religiosa, traz em sim uma utopia de beleza, de bondade e de verdade.

Quem já teve a experiência de conviver com culturas diferentes pode saborear melhor esta informação. Pois o sorriso e a esperança presente cada criança, a energia e beleza de cada jovem, a maturidade e o trabalho de cada adulto e a serenidade e sabedoria de cada pessoa idosa, revelam a força do amor que transcende o tempo e o espaço.

Que pena que as leituras erradas da Revelação e da Manifestação do Sagrado em nosso tempo produziram fundamentalismos que tem a sua origem na exteriorização e na força de liderança de alguns que se autodeterminaram portadores da Revelação e da Manifestação e produziram o que a história certifica: todas as religiões Abraâmicas: Judaísmo, Cristianismo e Islamismo, carregam consigo a beleza de da fé e também, infelizmente, o sangue dos inocentes… a violência e a morte estão nos currículos destas grandes religiões.

A “síndrome de Herodes” (cf. Mt2,1-12) envenenou e envenena a muitos. O desejo de poder e a manipulação da Revelação. Colocar o sagrado a nosso serviço. Até mesmo os regimes comunistas fazem de seus ditadores “deuses de estado” e criam suas liturgias e devoções. É preciso cuidado, pois no âmbito pessoal, esta síndrome atinge a todos e é preciso maturidade, ascese e espiritualidade pra não “condicionar” a vontade de Deus às vontades egocêntricas.

Os Magos que são guiados pela estrela são para nós ícones da busca humana. Como é difícil reconhecer que em meio a tantas religiões nos encontramos afastados de Deus. Como é difícil reconhecer que em meio a tantas mídias sociais vivemos uma desgraçada solidão. Como é difícil reconhecer que em meio a tanta riqueza econômica vivemos o flagelo da fome.

Imagine aquele olhar de Abraão para o céu diante de Promessa. Recordemos os “nossos olhares” para o mesmo céu que Abraão contemplou. Diante de milhões de estrelas… como discernir a Verdadeira e após, onde buscar a coragem para partir e rumo a nossa realização existencial.

Os pobres pastores, os magos, as pessoas idosas Simeão e Ana são sacramentos de uma vida guiada, de uma vida orientada. Como diz a canção, chegou a hora de tirar o remo de nossa história das mãos de Jesus… é preciso dar a Ele o leme de nossa história. A Epifania também é uma oportunidade de acordar, e deixar Deus ser Deus, parar de instrumentalizá-lo e de tê-lo como nosso empregado através de nossas novenas infernais.

“Se ao menos soubésseis da graça que Deus me concedeu para realizar o seu plano…” (cf.Ef3,2-3a.5-6). Ajoelhados como os magos, ajoelhados como Maria e José, ajoelhados com o coração envergado diante do Mistério da Encarnação… O Espírito nos lança num novo tempo onde as configurações culturais-econômicas-religiosas mudam na velocidade da rede e o movimento primeiro, infelizmente é o fechamento, o fundamentalismo religioso. Hoje na mídia encontramos a violência do fundamentalismo islâmico. Porém, não podemos nos esquecer do fundamentalismo da cristandade e da omissão dos “países cristãos” diante a atual economia que gera a morte silenciosa de milhões e milhões que não tem acesso aos direitos fundamentais de toda pessoa humana. Portanto, ajoelhemo-nos.

A Solenidade da Epifania nos faz contemplar o Cristo não como propriedade da Igreja e sim como Dom para toda a humanidade. É preciso acender as luzes (Is60,1-6) e abandonar o retorno à “Trevas” da uniformidade que descarta a tudo e a todos que não entram na “forma”, e gera assim, uma comunidade de excluídos eucarísticos.

Que bom seria se a “Folia de Reis” entrasse em todos os lares, mostrando assim, como as pessoas simples universalizam a fé em Cristo através do canto, do cafezinho, da comida partilhada, da alegria que entusiasma. Que bom seria se as religiões, inclusive a nossa, abandonassem a todo tipo de violência, e voltássemos a Beleza do Criador que nos fez diferentes, porém frutos de um mesmo útero, de uma mesma terra.

Que estrela me guia neste dia?

Que estrela me guia em nossa história?

Que estrela que guia nossa comunidade eclesial?

Quando demoramos muito em responder, corremos um risco de dizer que é Jesus… porém, muitos de nós somos guiados pelo “ódio de Herodes” que não suporta a ideia de “perder o trono e ser guiado por alguém”, assim, muitas vezes nos encontramos. A solenidade da Epifania nos lança como ouro na capacidade de ser provado, nos lança como incenso na capacidade da ascese espiritual e nos lança como mirra na capacidade de dar a vida.

Não nos esqueçamos que Epifania é Manifestação de Deus na simplicidade de uma vida humana, na fragilidade de uma criança e, este bebê é o Crucificado. O olhar para a Manifestação da Encarnação tem o ângulo da Paixão de Cristo. Que contempla à partir do inverso jamais atingirá a maturidade da fé, ou seja, não fará de história uma Epifania, uma Manifestação do Sagrado, será apenas um medíocre religioso que apenas se contenta com sua oração: vazia e omissa.

 

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