Do legalismo à liberdade!

por pe. Éder Carvalho Assunção – Missionário da Prelazia de Lábrea no Corno da África [email protected]

Uma leitura orante da liturgia dominical:

Ex20,1-17; Sl18; 1Cor1,22-25, Jo2,13-25

Quando falamos em leis, mandamentos, regras, estatutos e outras legislações temos a impressão  que algo pesado está sobre os nossos ombros. Sabemos que os sinais do processo de humanização se deram justamente através dos  “acordos sociais”, ou seja, a vida comunidade. Deixou-se assim a “auto-referencialidade” para a “sócio-referencialidade”.

Na bíblia encontramos também as legislações dos antigos povos semitas do Oriente Médio que foram incoporadas na tradição do povo de Israel. O interessante é que na leitura do povo hebreu a legislação, ou seja, os mandamentos, deixa de ser simplesmente jurídica e adquire um caráter teológico: “A lei como caminho dado por Deus rumo a felicidade”.

O problema, ontem e hoje, se dá quando se manipula a aplicação ou a negação da lei à partir da auto-referencialidade, esquecendo assim do caráter social e do projeto comunitário de salvação. Mesmo dentro do cristianismo encontramos tradições que afirmam que “a salvação é individual”, como se a realidade celeste fosse simplesmente a satisfação do ego. Abandona-se assim o coração da tradição bíblica: a salvação é universal, o projeto é para o Povo Santo de Deus, que não se resume numa seita cristã, mas em toda a humanidade.

Neste tempo da quaresma temos “legislações devocionais” sobre a prática do jejum, da esmola e da oração. Podemos aqui fazer uma leitura à partir da liturgia da palavra deste domingo:

  1. Jejum:  Muitos pensam que o jejum é um “regime quaresmal”, onde basta se abster-se de carne, porem se esquece da espiritaludade motivante: “Só Deus basta” (cf. Obras Completas de Santa Teresa). Ao jejuar celebramos a alegria de ser de Deus e assim, observamos também as vezes que nos deixamos levar pelas futilidades passageiras que geram prazeres descartáveis e desintegradores.  Por isso, deixamos a “esperteza do homem” para abraçar a loucura de Deus. Muitos se contentam em simplesmente abster-se de coisas, outros “se contentam em contentar a Deus” (Beata Myriam de Jesus). O jejum deixa então de ser uma “regra” simplesmente para ser um símbolo de amor, um símbolo de loucura, um símbolo de compaixão. O verdadeiro jejum se faz com o Cristo no altar da Cruz, onde pela fé-vocação-missão, permanecemos firmes todas as vezes em que pedimos água e por causa da missão, recebemos vinagre.
  2. Esmola: tanto no Brasil como aqui na África… tive que engolir seco as “esmolas” de alguns “cristãos de missa” que pensam a pratica da esmola é transformar a vida do pobre em lixeira das coisas que “eu não mais utilizo”. Quantos que aparecem felizes dizendo, vim fazer caridade, quando na verdade… não passa apenas de uma limpeza de guarda-roupa ou uma maneira de se desfazer dos entulhos que há anos e anos restam dentro da casa. A verdadeira esmola é a oferta daquilo que eu tenho de melhor e não daquilo que me sobra. A tradição bíblica nos ensina que a primeira parte de nossa fortuna pertence ao pobre. Esmolar não significar da comida ao pobre e sim convidar ao pobre para que tome parte em nossa mesa. “Ah… vivemos num tempo de violência”… eis a exclamação daqueles que além se serem mesquinhos criminalizam e estigmatizam os pobres…
  3. Oração: creio que Jesus no templo nos ensina a verdadeira vida de oração. Um combate contra os mercadores que “habitam” a casa de Deus. Estes mercadores, na verdade, representam nossas paixões desordenadas, que transformam nossa vida em oração numa bolsa de valores, onde a minha prece se resume em pedir coisas. A mídia católica, não em sua totalidade… mas em grande parte, “deseduca” neste sentindo, formando milhares de medíocres pedintes, nos espiritualimos do “toma lá da cá” através das “novenas milagrosas” e pouco ensina a arte do partilhar e aceitar a vontade de Deus. Muitos tem os dedos calejados por causa do rosário… porém não trazem em seu corpo os “calos” que deveriam ser produzidos na marcha rumo aos pobres, como fez a Virgem Maria. Muitos se ajoelham e choram diante de Jesus Sacramento e são indiferentes a dor do outro, se inclinam na igreja, mas não se inclinam no serviço de compaixão. Estes vendedores do templo… somos nós… Jesus pouco tempo passou dentro do templo, a sua vida sempre foi uma caminhada, fazendo o bem e curando a todos. Infelizmente, hoje, somos a medíocre igreja do Templo, a igreja do mercadores, transformamos a evangelização em construção de edifícios e esquecemos do essencial… o outro, a sua vida, as suas alegrias… as suas dores… como nos ensina o Vaticano II. Graças a Deus, Franciso, o bispo de Roma, sacode a Igreja com o Evangelho da Alegria e nos ensina “precisamos ser uma Igreja em saída”.

E agora José? O que faremos… Jesus nos ensina… destruir os templos idolátricos disfarçados de cristianismo e assim, renascer em seu Corpo Ressuscitado! Do legalismo à liberdade!

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